quinta-feira, 27 de julho de 2017

Interações silenciosas



Recordo-me da relação com meu pai. conversávamos pouco, e quando o fazíamos eram monólogos de meu pai referindo-se frequentemente a seu próprio pai, meu avô, que não conheci.

Durante muito tempo reclamei, sofri, acho que justamente da falta de diálogo, de compreensão, de escuta de meu pai com relação ao que se passava comigo. Eu simplesmente não sabia enunciar meus sentimentos porque não escutava dele nada que não fosse objetivo formal, concreto. Meu pai expunha sua visão de mundo isenta de sentimentos ou emoções. Pelo menos não os expunha facilmente.

Esse não dito, esse não falado me fez buscar ansiosamente âmbitos onde havia lágrimas, desconfortos, entusiasmos, paixões. Os encontrei na arte e nas terapias.

Passaram-se muitos anos e hoje penso que, se de fato, não tínhamos conversas com palavras tínhamos silêncios compartilhados, interações silenciosas. Estes silêncios hoje estão profundamente presentes na minha memória.

Lembro dos passeios mudos que fazíamos em lugares no campo, caminhando em silêncios. Outros onde compartilhávamos momentos diante de objetos sendo concertados na sua pequena oficina. Ele gostava que eu estivesse ali e eu gostava de vê-lo manusear as ferramentas. Ás vezes algumas palavras eram entoadas mas que ressoam na minha memória como murmúrios inaudíveis.

Percebo hoje que nesses momentos, nessas interações silenciosas estabelecíamos uma troca, um fluxo um intercambio de presenças. Percebo hoje que com algumas pessoas, em alguns lugares, em alguns momentos estabelecem-se interações silenciosas. Muito é trocado nestes momentos.

Quantas pessoas apreciam momentos em que estão presentes uns ao lado de outros, às vezes em ambientes contíguos e nem uma só palavra é trocada. No entanto as almas sorriem e se alimentam mutuamente pelo simples saber que o outro está lá.


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