O Todo, à que também chamo de
Infinito Caos, existe e ponto. Creio que dentro da intensa magnitude desse Todo
no qual estamos envolvidos, e do sentimento de estupor que ele nos causa, somos
levados a organizar abordagens/visões em partes e seqüências que nos dêem uma
ilusão calmante. Chamamos estas seqüências de compreensões e lógicas. Cultivamos
e ensinamos estas seqüências para nos manter agasalhados do frio do Infinito
Caos. O que chamamos de compreensão são essas ilusões compartilhadas. Depois de
compartilhadas à exaustão passamos a denominá-las “verdades”. O mundo tem a
plasticidade de conformar-se a estas “verdades”. Criamos assim a chamada “realidade”
e as coisas passam a funcionar dentro desta “realidade”, criada e
compartilhada.
Crianças pequenas como ainda não
adotaram a “compreensão compartilhada” têm uma liberdade, criatividade e comportamentos
que relacionamos com aspectos que decidimos intitular de maneira condescendente
como “coisas de criança” ou “loucuras de criança”.
Muitas vezes irritados com essas “loucuras”
as contrapomos e impomos nossas “realidades”, por vezes com tanta fúria que
anulamos a liberdade e criatividade das crianças.
Xamãs, curandeiros e crianças têm
a capacidade de organizar o Infinito Caos de forma dinâmica e à sua própria maneira.
Podem acreditar e viver cada momento segundo uma forma. Quando quaisquer destas
formas não se encaixam, ou não servem mais, passam à outra.
Algumas pessoas sofrem por
relutar ou não acatar o pacto de “acreditar nas verdades montadas para fins de
convivência”. Há certamente sofrimento na impossibilidade de encaixar-se nestas
“verdades”. Esse sofrimento corresponde à dor de abrir mão de si mesmo, a
desistir de si e submeter-se às verdades coletivas/culturais. Como há o aceno
de diversos prêmios se assim o fizerem muitos acabam por fazê-lo. Alguns seguem
ao longo da vida pagando o preço de não fazê-lo.
Já os xamãs podem trafegar entre “verdades”
diferentes, organizadas de maneiras diversas. São capazes de dialogar com as “verdades”
de diferentes pessoas. Como são plásticos e abertos podem transitar pelas
estruturas das “verdades” carregadas por pessoas que os procuram para mitigar seu
sofrimento. Xamãs podem dialogar com as pessoas dentro das “verdades” que elas
criaram e ajudá-las a criarem novas “verdades” que as permitam viver sem tantos
sofrimentos.
De certa forma sabemos de tudo isso
e convivemos com estes fatos de maneiras mais ou menos integradas. Por sorte ou
azar essas verdades flexíveis de nossa criança interna de quando em quando irrompem
e produzem estranhas sensações. Assaltam-nos em sonhos, e por vezes em plena luz
do dia. Sacudimo-nos e tratamos de seguir com nossa vida, mas uma vez isso tendo
acontecido pode ser impossível seguir em frente incólume.
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