Uma iniciação coletiva
Em tempos passados, aqueles que
desejavam ir além do conhecimento vigente, aqueles que pressentiam que havia
algo além da realidade descrita pelo senso comum, aqueles que
desejavam algo mais, hoje descrito como um “crescimento interior”, “expansão de
consciência” ou "acesso a suas almas", buscavam. Buscavam algum lugar, alguma escola ou algum grupo com o qual pudessem explorar regiões diferentes do conhecimento humano. Esse anseio podia ser encontrado e desenvolvido em forma circunscrita a grupos secretos, a grupos esotéricos.
Esta necessidade de reserva, de
cuidado, era necessária, já que envolvia acesso a enfoque, atitudes e
abordagens da realidade fora do âmbito da cultura vigente. Tudo isso sujeito a facilmente
gerar distorções que poderiam, e puderam, dar lugar a incompreensões e, sobretudo
medos, e levando a acusações de feitiçaria, bruxaria e outros nomes.
Nestes grupos, os neófitos, após algumas
instruções preliminares, eram submetidos a rituais de iniciação que envolviam
provas de desapego e des-identificação com o objetivo não só de assegurar que
estes conhecimentos fossem mantidos em sigilo, mas acima de tudo para testar a
estrutura psíquica dos candidatos.
Eu mesmo vivi uma época, anos
setenta, em que falar de “energia” já era uma ousadia. Este termo feria muitos
intelectos e causava estranheza. Falar de centros energéticos era blasfêmia
pura, ocasionava cenhos franzidos e, com muita condescendência era considerado
“exótico”. (Convenhamos que mesmo hoje em dia uma grande parte da população ainda
olha com desconfiança pessoas que dizem ir ao psicólogo!).
Por outro lado há uma vulgarização
imensa de termos psicológicos que constam de livros, revistas assim como de novelas
de TV. Abundam em todos os meios de comunicação termos como: energias,
vibrações, espírito, alma, anjos, etc. Tudo isso reunido criativamente num
sincretismo desvairado que junta religiões, culturas orientais, medievais,
ancestrais, indígenas e extraterrestres. Cada pessoa se mune de suas figuras de
referência e constrói seu panteão, seu altar, temperado por cristais, velas,
incensos, fotos, e rituais.
Intelectualmente os tempos de
grupos esotéricos ou secretos não são tão mais necessários, o conhecimento com
respeito a aspectos que outrora eram do âmbito de poucos se alastra. Uma ampla
literatura aborda o mundo sob diversas óticas onde se tece com desenvoltura
ciência, religião, misticismo e o termo “espiritualidade”. Tudo isso acessível
em quaisquer livrarias, bibliotecas, ou pela internet
.
Em termos vivenciais, por outro
lado, é interessante observar que aquelas iniciações reservadas a poucos
candidatos que voluntariamente se apresentavam, neste momento planetário se
tornaram públicas, gerais e coletivas. Se não vejamos: Estão aí os terremotos,
tsunamis, enchentes, desabamentos e outras ações climáticas. Em termos sociais
as possibilidades de, por exemplo: uma demissão, uma separação conjugal, uma
ameaça à saúde, uma perda financeira, uma revolução, um acidente, crescem
exponencialmente, submetendo-nos cotidianamente a provas de desapego e des-identificação.
Em suma estamos todos sendo
iniciados. Podemos presumir que nossa humanidade está passando por um estágio
de crescimento compulsório.
São provas agudas. Não são
“castigos” como uns se apressam em diagnosticar. Correspondem
a uma necessidade coletiva de crescimento. Verdade que doem. O sofrimento que
vemos a nosso redor é prova disso. Mas a dor é maior quando nos revoltamos,
recusamos e rechaçamos este crescimento. É tempo de começarmos a desapegar-nos
de coisas e idéias, soltar nossas identificações, com coisas, com pessoas, com sentimentos
e idéias.